segunda-feira, 30 de junho de 2008

Fernão Capelo Gaivota - continuação II


Quando voltou a si, a noite já era velha. Flutuava à superfície negra do oceano, encharcado em luar. As asas eram enormes e esfarrapadas barras de chumbo, mas o fracasso pesava-lhe ainda mais nas costas. Desfalecido, desejou que o peso fosse bastante para o arrastar docemente até o fundo, e acabar com tudo.

Ao afundar-se na água, uma estranha voz cavernosa soou dentro dele. "Não há nada a fazer. Sou uma gaivota. A minha natureza limita-me. Se estivesse destinado a aprender tanto acerca do vôo, teria mapas em vez de miolos. Se estivesse destinado a voar a altas velocidade, teria asas curtas como o falcão e viveria de ratos em vez de peixes. O meu pai tem razão. Devo esquecer esta loucura. Devo regressar ao seio do bando e contentar-me com o que sou, uma pobre e limitada gaivota."

A voz sumiu-se e Fernão acordou. Uma gaivota passa a noite em terra... A partir desse momento, jurou tornar-se uma gaivota normal. Seriam todos felizes.

Morto de cansaço, arrancou-se da água densa e voou para terra, grato pelo que aprendera: a forma de poupar trabalho voando a baixa altitude.

"Mas não!", pensou. "O que eu era acabou-se; acabou-se tudo o que aprendi. Sou uma gaivota como outra qualquer e voarei como uma delas." Assim, subiu dolorosamente a trinta metros e bateu as asas com mais força, apressando-se a chegar a terra.

Sentiu-se melhor depois da decisão de ser apenas mais um dos do bando. Daí em diante não haveria mais laços a prendê-lo à força que o levara a aprender, não haveria mais desafios nem mais fracassos. E era bom deixar de pensar, e voar no escuro em direção às luzes da praia.

"ESCURO!" A voz irreal estalou em alarma. "AS GAIVOTAS NUNCA VOAM NO ESCURO!"

Mas Fernão não prestava atenção e não a ouvia. "É bom", pensava. "A Lua e as luzes brincando na água, atirando a pequenos lampejos, e tudo tão calmo, tão parado..."

"Desça! As gaivotas nunca voam no escuro! Se estivesse destinado a voar no escuro teria olhos de coruja! Teria mapas em vez de miolos! Teria as asas curtas do falcão!"

Envolto na noite, a trinta metros no ar, Fernão Capelo Gaivota... pestanejou. A dor e as resoluções desvaneceram-se.

Asas curtas. AS ASAS CURTAS DO FALCÃO!
"É isso! Como fui louco! Tudo o que preciso é de uma asinha curta, tudo o que preciso é fechar as asas o mais que puder e voar só com as pontas! ASAS CURTAS!"
Subiu a seiscentos metros acima do negro mar e, sem pensar um momento no fracasso ou na morte, apertou as asas de encontro ao corpo, deixou que apenas as pontas das asas cortassem o vento como lâminas de punhal e mergulhou na vertical.

O vento era rugido de um monstro na sua cabeça. Cem quilômetros por hora, cento e trinta, cento e oitenta, e ainda mais depressa. A tensão nas asas, agora que se deslocava à velocidade de duzentos quilômetros por hora, não chegava a ser tão forte como antes, a cento e trinta, e bastou-lhe mover só um bocadinho a ponta das asas para sair da queda sem dificuldade e disparar por cima das ondas como uma bala cinzenta de canhão apontada à lua.

Semicerrou os olhos para se proteger do vento e regozijou-se. Duzentos quilômetros por hora! E controlados! Se mergulhasse de mil e quinhentos metros, em vez de seiscentos, que velocidade...
As promessas de momentos antes estavam esquecidas, varridas por aquele enorme vento rápido. E, contudo, não sentia remorso por não cumprir as promessas que fizera a si próprio. "Essas promessas são só para as gaivotas que aceitam o vulgar. Quem conseguiu chegar à excelência da sua aprendizagem não tem necessidade desse tipo de promessa."

Quando o sol começou a romper, Fernão Gaivota treinava outra vez. Vistos de mil e quinhentos metros, os barcos de pesca eram pontinhos escuros no azul liso da água, e o Bando da Alimentação uma apagada nuvem de átomos de poeira, movendo-se em círculo.

Ele estava vivo, ligeiramente trêmulo de prazer, orgulhoso de que o seu medo estivesse dominado. Então, sem cerimônias, cingiu-se com as asas anteriores, estendeu as curtas, colocando as pontas em ângulo, e mergulhou diretamente em direção ao mar.

Quando passou os mil e duzentos metros, deslocava-se à velocidade máxima e o vento era um sólido muro de som contra o qual não podia mover-se mais depressa. Voava agora em pleno mergulho, à velocidade de trezentos e vinte quilômetros por hora. Engolia em seco, sabendo que se as asas se abrissem àquela velocidade ficaria reduzido a um milhão de pequenos fragmentos de gaivota. Mas a velocidade era poder, e era alegria e beleza pura.
Começou o desvio a trezentos metros. As pontas das asas vibravam e ressoavam contra o vento gigante. O barco e a multidão de gaivotas cresciam à velocidade de um meteoro e lançavam-se diretamente no seu caminho.

Não podia parar; e ainda nem sabia como iria virar àquela velocidade. A colisão seria morte instantânea. Era melhor fechar os olhos.

Aconteceu então nessa manhã, logo a seguir ao nascer do sol, que Fernão Gaivota atravessou o Bando da Alimentação como uma bala, riscando o céu a trezentos quilômetros por hora, de olhos fechados, num tremendo rugido de vento e penas. A Gaivota da Fortuna sorriu-lhe desta vez e ninguém foi ferido.
Na altura em que espetou o bico para o céu, ainda frechava o ar a duzentos e quarenta quilômetros por hora. Quando por fim diminuiu para trinta e voltou a abrir as asas, o barco era apenas uma migalha no mar, mil e duzentos metros abaixo.
Na sua mente latejava o triunfo. Velocidade máxima! Uma gaivota a TREZENTOS E VINTE QUILÔMETROS POR HORA! Era uma vitória, o maior momento da historia do bando; e, nesse mesmo momento, nasceu uma nova era na vida de Fernão Gaivota. Voando para a sua solitária zona de treino, encolhendo as asas para um mergulho de dois mil e quatrocentos metros, dispôs-se imediatamente a descobrir como virar.
O movimento de um centímetro numa única pena da ponta da asa produzira uma curva larga e suave, a tremenda velocidade, descobriu ele. Contudo, antes de descobrir isto, verificou que, se movesse mais de uma pena àquela velocidade, era disparado em movimento giratório como uma bala de espingarda... E Fernão fez as primeiras acrobacias aéreas de uma gaivota viva.
Nesse dia não perdeu tempo conversando com as outras gaivotas e voou até depois do pôr-do-sol. Descobriu o "loop" , o "slow roll", o "point roll", o "inverted spin", o "gull bunt", o "pinwheel".
Quando Fernão Gaivota se juntou ao bando na praia era já noite cerrada. Estava tonto e tremendamente cansado. Apesar disso, não resistiu ao prazer de voar num "loop" para a terra e de fazer um "snap roll" antes de aterrar. "Quando souberem do triunfo", pensava, "ficarão loucos de alegria. Como vale a pena agora viver! Em vez da monótona labuta de procurar peixe junto dos barcos de pesca, temos uma razão para estar vivos! Podemos subtrair-nos à ignorância, podemos encontrar-nos como criaturas excelentes, inteligentes e hábeis. Podemos ser livres! PODEMOS APRENDER A VOAR!"
Os anos vindouros brilhavam e trauteavam promessas.
As gaivotas estavam reunidas em conselho quando ele aterrou, e, segundo parecia, já estavam em reunião havia algum tempo. Na realidade, estavam à espera dele.

— Fernão Capelo Gaivota! É chamado ao centro! — As palavras do Mais Velho foram pronunciadas no tom mais solene. Ser chamado ao centro só podia significar grande vergonha ou grande honra. Ser chamado ao centro por honra era a maneira como eram designados os principais chefes das gaivotas. "Claro", pensou, "o Bando da Alimentação esta manhã viu o triunfo! Mas eu não quero honras. Não me interessa ser chefe. Só quero partilhar o que descobri, mostrar a todos esses horizontes que estão à nossa frente." Avançou um passo.
— Fernão Gaivota — disse o Mais Velho — é chamado ao centro por vergonha aos olhos das gaivotas suas semelhantes!

Foi como se lhe batessem com uma tábua. Os joelhos enfraqueceram-lhe, um enorme rugido ensurdeceu-o. "Ser chamado ao centro por vergonha? Impossível! O triunfo! Eles não podem compreender! Estão errados, estão errados!"

— ... pela sua desastrada irresponsabilidade — entoava a voz solene —, por violar a dignidade e a tradição da família das gaivotas...

Ser chamado ao centro por vergonha significava que seria banido da sociedade das gaivotas, desterrado para uma vida solitária nos Penhascos Longínquos.

— ... um dia Fernão Capelo Gaivota aprenderá que a irresponsabilidade não compensa. A vida é o desconhecido e o desconhecível, mas não podemos esquecer que estamos neste mundo para comer e para nos mantermos vivos tanto quanto pudermos.

Uma gaivota nunca contesta o conselho do bando, mas a voz de Fernão ergueu-se gritando:

— Irresponsabilidade? Meus irmãos! Quem é mais responsável do que uma gaivota que descobre e desenvolve um significado, um propósito mais elevado na vida? Passamos mil anos lutando por cabeças de peixe, mas agora temos uma razão para viver, para aprender, para descobrir, para sermos livres! Dêem-se uma oportunidade, deixem-me mostrar-lhes o que descobri...

O bando mostrou-se impenetrável como a pedra.
— Quebrou-se a irmandade — entoaram em conjunto todas as gaivotas, e, em perfeito acordo, taparam solenemente os ouvidos e viraram-lhe as costas.

sábado, 28 de junho de 2008

quarta-feira, 25 de junho de 2008

Recomeço


No aquário

O peixe reaprende a nadar:

sob as escamas

guardou o mar.

(Lenilde Freitas)


sábado, 14 de junho de 2008

Fernão Capelo Gaivota - continuação I

Não tardou muito que Fernão Gaivota voltasse a pairar no céu, sozinho, longínquo, esfomeado, feliz, aprendendo.

O tema era a velocidade. Ao cabo de uma semana de prática, conseguira aprender mais sobre velocidade do que a gaivota viva mais rápida.

A trezentos metros de altura, batendo as asas com toda a força de que era capaz, lançou-se numa vertiginosa picada direta às ondas e aprendeu por que razão as gaivotas não fazem vertiginosos mergulhos picados. Em escassos seis segundos passou a mover-se a cento e vinte quilômetros por hora, velocidade que desequilibra a asa no arranque para a subida.

Vez após vez sucedeu o mesmo. Por mais cuidadoso que fosse, trabalhando até o limite da sua capacidade, perdia o controle em alta velocidade.

Subir a trezentos metros, dando primeiro tudo em frente; depois, dobrar o corpo e cair em mergulho vertical. Mas, sempre que tentava subir outra vez, a asa esquerda atrapalhava-se e fazia-o rolar violentamente para a esquerda. Ao tentar recuperar, era a asa direita que se atrapalhava, e então tremeleava como as chamas, num selvático movimento desordenado de parafuso, girando para a direita.

Não conseguir ser suficientemente cuidadoso naquele arranque. Dez vezes tentou e dez vezes alcançou os cento e vinte quilômetros por hora, acabando sempre numa agitada massa de penas descontroladas que ia esmagar-se na água.

"A chave", pensou por fim, "deve estar em manter as asas paradas nas grandes velocidades — batê-las até chegar aos cento e vinte e depois pará-las."

Tentou outra vez a seiscentos metros, lançando-se no mergulho com o bico espetado, as asas bem abertas e firmes a partir do momento em que ultrapassou os cento e vinte quilômetros por hora. Precisou de uma força tremenda, mas deu resultado. Em dez segundos transformou-se numa mancha no céu, a cento e trinta quilômetros pro hora.

Fernão acabava de estabelecer um recorde mundial de velocidade para gaivota!

Mas a vitória durou pouco. No instante em que tentou a horizontal, no instante em que modificou o ângulo das asas, projetou-se outra vez naquele terrível desastre descontrolado, e, a cento e trinta quilômetros, foi como se tivesse sido atingido por dinamite. Fernão Gaivota explodiu a meia altura e esmagou-se num mar duro como tijolo.

A história do Reiki


Houve muitas lendas sobre milagres de cura dos Grandes Mestres, mas os relatos ficaram perdidos. Não encontrando provas concretas, os que acreditavam, guardaram para si, pois sabiam que não havia modo de provar o que acreditavam.

A história do REIKI se desenrola desde os primórdios da humanidade, certamente mais antigo que qualquer relato escrito.

O REIKI é uma parte de cada um de nós. Um dia foi universal e nunca deveria ter-se perdido. Na antiga civilização, hoje conhecida como MU, as crianças recebiam treinamento em REIKI I no começo da escola primária, em REIKI II durante o colegial, já o REIKI III, o treinamento de Mestre, era exigido dos educadores e estava disponível a quem quisesse recebê-lo. Quando as pessoas da cultura-raiz deixaram a terra de MU para colonizar o que hoje é a Índia e o Tibete, o REIKI continuou com elas, embora MU, posteriormente, tenha se perdido. As mudanças na terra, que primeiramente destruíram a Atlântida, produziram vários conflitos culturais, obrigando que o sistema de cura fosse conhecido só por poucos eleitos. Quando, no século XIX, um japonês buscou a origem do método de cura de Jesus e Buda, ele a encontrou entre os vestígios da cultura primeva de Shiva, nos ensinamentos esotéricos da Índia.

No Tibete existem registros de cura através das mãos há mais de 8 mil anos. Essas técnicas se expandiram pela Grécia, Egito, Índia e outros países apesar de a técnica ter-se perdido nos últimos dois milênios.

Existem fatos que indicam ter Jesus praticado REIKI no Egito. Jesus aplicava a técnica com muito sucesso e também dizia a seus apóstolos «curem os que estiverem doentes».

A história do REIKI começa em 1822, na cidade de Kyoto, no Japão. Existia um pequeno seminário cristão, cujo deão era Mikao Usui. Questionado pelos seus alunos sobre como Jesus realizava esses milagres e ainda se alguém mais poderia curar da mesma forma, não soube responder. Embora tivesse compreensão intelectual da Bíblia, não compreendia a maneira que Jesus curava.
Dr. Mikao Usui

Conta-se que este questionamento mudou a vida de Usui. Demitiu-se do cargo que ocupava no seminário e viajou para a América. Em Chicago, estudou Teologia e línguas antigas, formou-se doutor.

Durante seus estudos, o Dr. Usui aprendeu que Buda também realizava os mesmos milagres que Jesus, curando doentes e tendo um controle sobre a energia, canalizando o poder de Deus e do Universo.

Ao retornar ao Japão, o Dr. Usui começa a questionar os membros das diversas seitas do Budismo, se eles poderiam curar o corpo das pessoas como Buda curava. Os Budistas o informaram que a cura do corpo e do espírito não tinha ligação e que eles estavam concentrados na cura do espírito e não do corpo. Eles sentiam que o corpo e o espírito eram separados e que o espírito é que precisava de cura. A cura do corpo deveria ser feita por aqueles que se dedicavam à Medicina.

Dr. Usui, ao chegar a um mosteiro Zen-Budista, pediu permissão e foi aceito, para estudar. Por muitos anos, sob a direção do monge Zen, estudou os Sutras e os ensinamentos de Buda. Leu todas as traduções japonesas e não encontrou o que buscava. Consultou novamente o monge Zen e este lhe disse para meditar e receber a resposta interior. As meditações levaram usui a aprender chinês.

Após alguns anos, foi levado a estudar sânscrito. O sânscrito é a raiz de todos os idiomas e, portanto, haveria possibilidade de descobrir o que tanto buscava. Em poucos anos, o Dr. Usui conseguiu a maestria no sânscrito e pôde ler os livros sagrados do Budismo Tibetano. Nesses livros ele encontra os escritos que sente serem a chave para a cura. Mas, no seu achado, ele não encontrava como utilizar aquelas chaves e nem tinha como se certificar de que aquilo era realmente o processo correto de cura. Os textos não incluíam a informação de como ativar a energia e fazê-la funcionar.

Como tem sido afirmado, essa falta de informação nos Sutras (manuscritos em sânscrito) era intencional, feita com freqüência para manter os poderosos ensinamentos longe do alcance de mãos não preparadas para conhecê-los e usá-los corretamente.

Novamente o Dr. Usui pede orientação ao monge tibetano e decide meditar na montanha sagrada do Japão, o monte Kuri Yama. Durante 21 dias ele medita e ora pedindo a iluminação. No 21º dia, ele acorda ao alvorecer e ainda está escuro. Levara consigo 21 pedrinhas para não perder a noção do tempo e joga a última delas. Ele reza pedindo novamente a Deus que confirme o seu achado e que lhe seja dada clareza e iluminação de como usar o conhecimento.

Ao jogar fora a última pedrinha, uma luz aparece no leste. Esta luz começa a se tornar mais brilhante e se aproxima do Dr. Usui. Ele fica assustado, ameaça fugir. Então, escuta a voz dizer: «Você buscou por 21 anos e tem jejuado nesses 21 dias. Você tem pedido a iluminação e confirmação e agora quer fugir?». Ele aquieta o seu intelecto, dizendo a si mesmo: «Se a luz é para mim, aceito a iluminação».

A luz se torna mais brilhante e corta os céus como um relâmpago e lhe toca o terceiro olho. Usui tem a sensação de estar morrendo. Ele nunca se sentira assim e seu campo de visão parece um arco-íris. Fora deste arco-íris aparecem luzes dourada e branca. Cada uma destas bolhas é como uma lâmpada contendo os caracteres sânscritos que ele descobrira nos Sutras Tibetanos. Uma voz parecia lhe dizer: «Estas são as chaves da cura; aprenda-as, não as esqueça e não permita serem novamente perdidas».

Dr. Usui olhava para os céus e ouvia a voz… até que se sente desperto e o sol está alto e ele diz para si mesmo: «eu tenho as chaves para a cura, eu não as esquecerei e não permitirei que se percam». E quando ele sente que não morrera, que ainda estava na terra, começa a descer a montanha, profundamente excitado e apressado. Ele quer voltar ao mosteiro e dizer ao monge o que aconteceu.

Na sua pressa em descer a montanha, o Dr. Usui machuca o pé e consegue parar o sangramento com o processo que acabara de aprender. Ele sente as suas mãos diferentes, elas estão muito quentes. Ao chegar ao pé da montanha ele tem fome. Pára numa estalagem onde são servidos os que estão em peregrinação. Ele insiste com o estalajadeiro para ter uma refeição «normal» e é atendido. Apesar dos 21 dias de jejum, ele come tudo e tem uma boa digestão completa.

Quem o serviu foi a neta do estalajadeiro, e ela tem o rosto inchado e o dente infamado. O Dr. Usui pergunta se ela aceita ser curado e usa o processo que acabara de aprender. O inchaço e a inflamação cedem e em poucos minutos a garota está bem. O estalajadeiro não aceita o pagamento da comida porque o Dr. Usui lhe presta um grande serviço, eles moravam longe e não tinham como pagar por assistência médica.

O Dr. Usui volta ao mosteiro e conversa com o monge. Ele trata o monge e o cura de uma artrite. Mas agora que ele tem as chaves da cura, ele quer saber mais como desenvolvê-las. Então resolve deixar o mosteiro e morar no bairro dos mendigos, curar os enfermos e aflitos.

Durante sete anos ele ministra a cura desde o amanhecer até tarde da noite. Ele curava a todos e era disciplinado e dedicado. Ele compreende como o REIKI flui pelo seu corpo e como o corpo se curava.

Um dia, o Dr. Usui encontra um pedinte cujo rosto lhe parecia familiar e o interroga. Ele se identifica como um dos primeiros mendigos a quem o Dr. Usui curara. O Dr. Usui lhe pergunta por que ele continua mendigo e o pedinte explica que fez tudo o que lhe fora mandado fazer depois da cura – fora ao Templo e recebera um nome, conseguira um emprego e se casara. Mas tudo isso era muita responsabilidade e ele decidira continuar mendigo. Sendo mendigo, ele não tinha que assumir responsabilidades por si mesmo.

O Dr. Usui decide então deixar o bairro dos mendigos. Retornando ao mosteiro, ele agradece por todos os ensinamentos que lhe foram dados no monte Kuri Yama. Ele medita sobre tudo o que acontecera. Compreende que fizera o contrário do que os Budistas vinham fazendo e que, ao se preocupar com a cura do corpo, ele esquecer da cura do espírito. Compreende que a pessoa em tratamento também tem de assumir a responsabilidade pelo seu processo de cura. Os Mestres da Cura Espiritual o levaram a compreender muitas coisas transmitindo-lhe os Cinco Princípios Espirituais do REIKI. Ele compreende que distribuíra a cura sem que o outro assumisse a responsabilidade pelo tratamento e não trocasse a energia pelo serviço. Dr. Usui compreendeu que os Cinco Princípios acrescentavam uma dimensão espiritual à cura física.

O Dr. Usui compreende também que, ao dar a cura sem que houvesse esforço pessoal de quem a recebera, não lhe era dado valor e ainda, que ao dar simplesmente, ele ajudara a imprimir padrões de miséria na mente dos que tratava.

Tudo isso trouxe transformações à vida de Dr. Usui e ele compreende que o REIKI é um processo de transformação de consciência que vem do coração e que é através do coração que a plenitude da vida pode ser obtida. Ele compreende também que a aplicação dos Cinco Princípios na vida quotidiana leva a essência a se manifestar em todos os níveis da vida da pessoa. E que a forma como as pessoas agem, reagem e compreendem a si mesmas e aos outros muda para se centrar na consciência divina EU SOU.

A partir daí, o Dr. Usui passa a ensinar o REIKI por todas as ilhas do Japão. Entre os anos de 1850 e 1898, quando morreu, tinha formado 18 mestres, dentre estes o Dr. Hayashi, que o sucedeu.

Não há registros escritos do Dr. Usui. O que se estabeleceu como aprendizado do REIKI foi mantido como conhecimento «de boca a ouvidos».

Durante o período em que viajou pelo Japão, o Dr. Usui chegava às cidades onde não conhecia ninguém e caminhava pelo mercado carregando uma tocha acesa. Muitos riam dele – o homem tolo que carregava uma tocha acesa em pleno dia. Mas isto atraía a atenção das pessoas e o Dr. Usui as convidava para as reuniões m que as pessoas manifestavam o desejo de aprender o processo do REIKI. É desta forma que o Dr. Usui encontra o Dr. Chujiro Hayashi, um oficial da Marinha, de família rica e tradicional e que é o responsável pela montagem do que foi a primeira clínica de REIKI no Japão, localizada em Tóquio.


Dr. Chujiro Hayashi


Dr. Chujiro Hayashi torna-se o Grande Mestre de REIKI com a morte do Dr. Usui. Formou 16 mestres, entre eles, duas mulheres, sua esposa Chie Hayashi e Hawayo Takata, que trouxe o REIKI para o Ocidente.

Hawayo Takata



Consciente da importância do REIKI, o Doutor em Medicina Hayashi colheu comprovações de tratamentos, produzindo assim ampla documentação que demonstra que o REIKI além de encontrar a fonte dos sintomas físicos revitaliza o corpo na sua totalidade.

Com todas essas informações e comprovantes de tratamentos, Dr. Hayashi repensou as posições e pôde sintetizá-las em níveis, para uma aplicação mais eficaz.

quinta-feira, 12 de junho de 2008

Todo o tempo do mundo

Rui Veloso - Todo o tempo do mundo



Ao meu amor, amigo, amante, parceiro, meu mundo! Feliz dia dos namorados!

Todo O Tempo Do Mundo
Carlos Tê / Rui Veloso


Podes vir a qualquer hora
Cá estarei para te ouvir
O que tenho para fazer
Posso fazer a seguir

Podes vir quando quiseres
Já fui onde tinha de ir
Resolvi os compromissos
agora só te quero ouvir

Podes-me interrompere contar a tua história
Do dia que aconteceu
A tua pequena glória
O teu pequeno troféu

Todo o tempo do mundo
para ti tenho todo o tempo do mundo
Todo o tempo do mundo

Houve um tempo em que julguei
Que o valor do que fazia
Era tal que se eu parasse
o mundo à volta ruía

E tu vinhas e falavas
falavas e eu não ouvia
E depois já nem falavas
E eu já mal te conhecia

Agora em tudo o que faço
O tempo é tão relativo
Podes vir por um abraço
Podes vir sem ter motivo
Tens em mim o teu espaço

Todo o tempo do mundo
para ti tenho todo o tempo do mundo

terça-feira, 10 de junho de 2008

Valores e atitudes fundamentais da geração do «Orpheu»

Capa do 1º número da revista Orpheu,
autoria de José Pacheco

Para os modernistas portugueses, «[...] ter um pouco de Europa na alma», - frase de Fernando Pessoa que Sá-Carneiro destaca entusiasticamente na sua correspondência -, funcionava praticamente como uma divisa orientadora de todos os actos estéticos. Este querer-ser europeu era também sinônimo de uma dupla meta, fundamental para a compreensão do Modernismo e do seu caráter vanguardista. Tratava-se do desejo de universalidade que impunha a superação das limitadas fronteiras portuguesas e, simultaneamente, de uma vontade de ruptura com a literatura do passado que sugeria uma viragem rumo ao futuro e despertava o fascínio por tudo quanto fosse inteiramente novo. Assim Pessoa, mantendo certa euforia profética e nacionalista que já lhe era patente nos tempos da colaboração na revista A Águia, afirmará da geração de Orpheu:

«Não somos portugueses que escrevem para portugueses; [...] somos portugueses que escrevem para a Europa, para toda a civilização; nada somos por enquanto, mas aquilo que agora fazemos será um dia universalmente conhecido e reconhecido. [...] Não pode ser de outra maneira, realizamos condições sociológicas cujo resultado é inevitavelmente esse. Afastamo-nos de Camões, de todos os absurdos enfadonhos da tradição portuguesa e avançamos para o futuro.»(1)

Para além da exigência de absoluta originalidade e de pleno cosmopolitismo, misturados com um patriotismo muito especial, o Modernismo representava ainda, como se vê, uma importante afirmação transnacionalista e continha uma nítida dimensão «futurante», renovadora e agressiva. Através delas separava-se completamente do passado, orientando-se projetivamente para a descoberta de novas expressões da sensibilidade estética. Por outro lado, distinguia-se em absoluto do nacionalismo saudosista seu contemporâneo, romanticamente «fixado» num passado mítico de cuja recuperação fazia depender a salvação pátria.

Assim, a imperiosa reivindicação de novidade e modernidade transmitida por «Orpheu» passava obrigatoriamente por uma perspectivação européia do «modo de ser literário» português. Tratava-se de efetuar uma profunda e radical revisão de toda a literatura nacional através de um novo espírito, liberto dos «fantasmas» do servilismo e de qualquer sentimento de inferioridade face ao estrangeiro. Esta nova «consciência da Atualidade» surgiria então, pelo contrário, plenamente afirmativa e orgulhosa de si e da cultura que representava.

Em suma, para abolir o tradicionalismo e atenuar o provincianismo caracteristicamente portugueses, os novos poetas pretendiam instaurar uma nova «visão do mundo» capaz de revolucionar e reformar totalmente a mentalidade cultural nacional. Só uma estratégia de abertura e, simultaneamente, apropriação criativa dos valores europeus, viabilizaria o surgimento de uma sensibilidade estética diferente. Por sua vez, esta seria a única forma de realizar um reencontro decisivo da genuína «alma literária nacional» consigo mesma.

O Modernismo português incluía em si o projeto de uma estética aberta, essencialmente expansiva, eclética e disponível a tudo quanto se mostrava diferente, estranho, exótico. Dela faziam parte uma extrema plasticidade e versatilidade, características positivas da alma portuguesa que apareceram assim renovadas e multiplicadas pelos poetas órficos, através de uma tendência, que podemos considerar genérica, para a diversificação estética expressa, designadamente, pelo delírio sensacionista do «ser tudo de todas as maneiras». Ou, utilizando a agressividade tipicamente futurista, em forma de «Ultimatum»:

«Só tem o direito ou o dever de exprimir o que sente, em arte, o indivíduo que sente por vários. [...] O que é preciso é o artista que sinta por um certo número de Outros, todos diferentes uns dos outros, uns do passado, outros do presente, outros do futuro. [...] Nenhum artista deverá ter só uma personalidade.» (2)

Implicando uma dispersão e um desdobramento sistemático em todas as práticas culturais e potencialidades civilizacionais possíveis, esta experiência de pluralidade era a única regra - embora paradoxalmente anárquica - compatível com esse «maravilhoso movimento sintético» que foi «Orpheu».

É importante salientar ainda, o mais amplo alcance desta missão indisciplinadora de «Orpheu», que consistia na tarefa de «ampliação» do «psiquismo nacional». Tratava-se de criar civilização fazendo arte e fazê-la sobretudo em função de uma irrequieta busca de libertação dela mesma e do ser-artista. Tal revelava a consciência, natural para o artista moderno e presente nos nossos novos poetas, da implicação essencial existente entre a arte e a vida. Para além disto, também a radicalidade da sua opção pela arte, essa «aceitação sem limites da seriedade da poesia» fez, como nota Eduardo Lourenço, «a importância única da geração de Orpheu»(3).

Em suma, os órficos consubstanciaram valores e atitudes fundamentais da modernidade, tendo sido entre os portugueses os únicos testemunhos vivos da crise geral e consequente procura de novos padrões de toda a civilização ocidental então em curso. O seu «sê plural como o universo» reflete a fragilidade e o nihilismo de toda a consciência moderna, verdadeiramente uma «consciência infeliz» ao descobrir a absoluta imprevisibilidade essencial de tudo, e também, o sentimento de incerteza infinita que a possibilidade - cada vez mais precária - de pensar a divindade ou qualquer unidade não pode deixar de lhe provocar.

Do ponto de vista estético-literário, o período que se situa entre 1912 e 1917 é fértil em «ismos». Não é fácil estabelecer entre eles uma sucessão linear ou uma hierarquização clara. Tanto nos textos de Pessoa, o poeta mais ativo quanto à criação dos diferentes movimentos, como em Sá-Carneiro, «seu confrade em paulismo e lugar-tenente interseccionista»(4), frequentemente aparecem as mesmas designações usadas em acepções diferentes ou trocadas relativamente à eventual data do seu aparecimento. O autor de «Mensagem» ressente-se de toda esta agitação dispersiva, caracterizando-a como «excesso de forças vivas em acção, conflito e evolução interconexa e divergente»(5).

Esta espécie de «estado anárquico» é explicável pela própria natureza da aventura modernista. Por um lado, os «ismos» surgem, na sua forma vertiginosa e efêmera, como experimentações desordenadas, tentativas indisciplinadas de substituição dos critérios estéticos existentes e de produção de outras expressões literárias mais adequadas à nova noção do mundo, da arte e até da vida. Por outro lado, o espírito mistificador, excêntrico, paradoxal e contraditório dos novos poetas, contribuindo propositadamente para o caráter fragmentário e hermético que a cada passo os textos apresentam e responsável pela consagração do «reinado da incoerência» na sua prática literária.

Certo tom «apalhaçado» que em parte permaneceu como emblema distintivo desta geração, pode ser interpretado como uma defesa contra a hostilidade e tacanhez com que o meio literário português recebia as manifestações da nova estética, funcionando, ao mesmo tempo, como uma espécie de aval protetor dessa ousadia de querer pensar e praticar a inovação sem limites. Por outras palavras, se o desejo de mistificação é um mal necessário em termos de vanguarda, é porque ele é «o preço que deve ser pago e sempre será pago por uma atitude que não tem por definição nenhuma garantia no passado»(6).

Na verdade, existe um modo de ser específico desta geração indissociável das suas opções estéticas. Como defini-lo? Trata-se de sensibilidades superiormente requintadas e fortemente individualistas, determinadamente anti-sociais e anti-sociáveis, que cultivam acima de tudo a diferença e a exceção e professam um arrogante e assumido aristocracismo de tonalidade vincadamente decadente e elitista. Aliás, a revista Orpheu fora apresentada ao público por Luiz de Montalvôr, exatamente como sendo um «exílio de temperamentos de arte que a querem como a um segredo ou tormento», correspondendo a um «ideal esotérico» e tendo o «princípio aristocrático» como único critério estético explícito. (7)

Valorizando exclusivamente o raro e o insólito, os órficos gostavam de definir a sua estética de forma tão extravagante quanto enigmática, usando e abusando de toda a espécie de blagues: «ter o aplauso de lepidópteros e democráticos [...] é o pior que nos pode suceder», sublinha Sá-Carneiro numa carta a Fernando Pessoa, acrescentando mordazmente:

«Veja o que sucedeu às bicicletas: artigo de luxo que, começando a ser empregado pelos democráticos, desapareceu da via pública como sport elegante. A pior recomendação dum produto de luxo é o seu consumo popular.» (8)

Almada Negreiros, por seu turno, «explica-nos» em estilo hermético tipicamente vanguardista, o significado que tinha para o grupo esta quase-senha:

«[...] A mais profunda das [...] criações de vocábulos pejorativos em dias do Orpheu. Lepidóptero simula com o próprio vocábulo palavra erudita com todo o fingimento de individuar categoria de exceção.» (9)

Outro termo que fazia parte deste glossário restrito e provocatório dos novos poetas, era «botas delástico», o qual, como explicava o pintor, «significa... Só botas delástico ignoram a sua significação» (10)

Percorrendo os textos de Pessoa, Mestre também em sutis «fingimentos» e geniais boutades, o que se torna difícil é escolher, entre tantos exemplos, até porque o poeta faz «todos os esforços para não ser a mesma coisa durante três minutos a fio por ser má higiene estética». Tal atitude é perfeitamente natural uma vez que «graças a Deus, não há nenhum instinto do sensato em moderna literatura». Tal circunstância, aliás, não deixava de reflectir inteiramente a própria origem de «Orpheu» pois, enquanto a tendência para o «bom gosto» era em geral proeminente, em contrapartida, não havia em nenhum dos elementos do grupo quaisquer vestígios de «bom senso».

Os principais «ismos» do movimento modernista - além do paúlismo, o sensacionismo, o interseccionismo e também, apesar de ligeiramente secundarizado por Pessoa, o futurismo, têm em comum um espírito decadente que os aproxima e até certo ponto igualiza. Dado que este representa um substrato ativo da estética moderna, vale a pena referir brevemente a definição que Fernando Pessoa sugere.

Assim, o decadentismo português, além de «proveniente da falência de todos os ideais passados e mesmo recentes»(11), é misto, caracterizando-se como uma composição de «tipos» diferentes de decadentismo de raízes diversas e européias. Em primeiro lugar ele é «uma continuação [...] daquela parte do decadentismo que representa uma revolta contra as regras, uma introspecção excessiva»(12). Em segundo lugar, ele é o que reivindica «absoluta indiferença para com a humanidade, a religião e a pátria»(13). Daqui resulta finalmente um «terceiro tipo de decadentismo» que surge precisamente «na corrente portuguesa que veio [?] [sic] a manifestar-se em Orpheu, e constitui uma exacerbação dos dois reunidos»(14).

Por outro lado, pode dizer-se que os vários «ismos» acabam por se integrar no sensacionismo afirmando-se mais enquanto modos dessa «corrente estranha - como diz Pessoa - a que pertencem a maioria das composições de Orpheu, os livros de Sá-Carneiro, exceto Princípio e outras composições análogas»(15), do que como tendências literárias independentes.

Concentremo-nos por último um pouco nessa espécie de consequência literária do cubismo que é o interseccionismo. Este «ismo» salienta-se neste contexto, não só pela sua importância na avaliação do caráter inovador da estética modernista, mas pela relação estreita que detém com o fenômeno da heteronímia e a questão da sua gênese. Como aparece então projetada na poesia a característica essencial da pintura cubista?

Na verdade, a «decomposição do modelo» que os cubistas realizam é intelectualizada pelos órficos, ou seja, ao ser transferida da pintura para a literatura, é recriada em termos do que julgam ser «a esfera própria dessa decomposição - não as coisas, mas as nossas sensações das coisas», desembocando, precisamente, na «atitude central» dos poetas sensacionistas, para quem «a única realidade da vida é a sensação [e] a única realidade em arte é a consciência da sensação»(16).

Por seu turno, o interseccionismo, definindo-se como consciencialização dessa «deformação» de planos operada pelo cubismo, a partir da qual cada sensação passa a ser «na realidade constituída por diversas sensações mescladas», revela-se como processo privilegiado de execução do mesmo sensacionismo, o qual, justamente, «pretende realizar na arte a decomposição da realidade nos seus elementos geométricos psíquicos»(17).

Observemos, para terminar, dois sugestivos exemplos encontrados, respectivamente, na obra Céu em Fogo de Mário de Sá-Carneiro e no poema «Chuva Oblíqua» de Fernando Pessoa:

«O omnibus que o conduzia resvalava agora barulhento de erragens pela Avenida monumental, e esse ruído acre, unindo-se às luzes imensas que o fustigavam zebrando-se através das vidraças tilintantes, dava bem a expressão rítmica da sua alma actual. A sua alma de hoje era toda vidros partidos e sucata leprosa.

[...]

Disperso, o artista olhou em redor de si. Atentou no panorama que o envolvia e pôs-se a delirá-lo, seguindo-o na sua multiplicidade. Pois o cenário interior do auto-omnibus era inconstante: variava momento a momento em função da paisagem exterior. Ao dobras as esquinas, os grandes prédios e as árvores atravessavam-no resvalando em semi-círculo, e os candelabros ziguezagueantes vergavam-se enclavinhadamente, penetrando em rodopio pelas janelas.»(18)

Atravessa esta paisagem o meu sonho dum porto infinito

E a cor das flores é transparente de as velas

de grandes navios

Que largam do cais arrastando nas águas por sombra

Os vultos ao sol daquelas árvores antigas ...

O porto que sonho é sombrio e pálido

E esta paisagem é cheia de sol deste lado ...

Mas no meu espírito o sol deste dia é porto sombrio

E os navios que saem do porto são estas árvores ao sol ...

Liberto em duplo, abandonei-me da paisagem abaixo ...

O vulto do cais é a estrada nítida e calma

Que se levanta e se ergue como um muro,

E os navios passam por dentro dos troncos das árvores

Com uma horizontalidade vertical,

E deixam cair amarras na água pelas folhas uma a uma dentro ...(19)


(1) Fernando Pessoa, Páginas Íntimas e de Auto-Interpretação, Lisboa, Ática, s/d, pp. 121-122.
(2) Portugal Futurista, (3ª edição facsimilada), Lisboa, Contexto, pp. 33-34.
(3) Eduardo Lourenço, Tempo e Poesia, Porto, Inova, 1974, pp. 57-58.
(4) Mário de Sá-Carneiro, Cartas a Fernando Pessoa, vol. I, Lisboa, Ática, 1978, p. 158.
(5) Fernando Pessoa, Cartas a Armando Cortes-Rodrigues, Lisboa, Horizonte, 1985, p. 34.
(6) Eduardo Lourenço, «Sentido e não sentido do moderno», in Pentacórnio e último, Lisboa, (sem nome).
(7) Orpheu, vol. I, Lisboa, Ática, s/d, p. 11.
(8) Mário de Sà-Carneiro, Cartas a Fernando Pessoa, vol. II, Lisboa, Ática, 1979, pp. 83-84.
(9) Almada Negreiros, Orpheu - 1915/1965, Lisboa, Ática, s/d, pp. 27-29.
(10) Fernando Pessoa, Páginas Íntimas e de Auto-Interpretação, Lisboa, Ática, s/d, p. 167.
(11) Idem, Ibidem, p. 176.
(12) Fernando Pessoa, Páginas Íntimas e de Auto-Interpretação, Lisboa, Ática, s/d, p. 204.
(13) Idem, Ibidem, p. 176.
(14) Fernando Pessoa, Páginas Íntimas e de Auto-Interpretação, Lisboa, Ática, s/d, p. 163.
(15) Idem, Ibidem, p. 137.
(16) Páginas Íntimas e de Auto-Interpretação, Lisboa, Ática, s/d, pp. 187-188.
(17) Mário de Sá-Carneiro, Céu em Fogo, Lisboa, Ática, 1990, p. 127.
(18) Fernando Pessoa, Obra Poética, Rio de Janeiro, Aguilar, p. 113.
in REIS, Carlos (coord.), Literatura Portuguesa Moderna e Contemporânea, Lisboa, Universidade Aberta, s/d, pp. 170-175.

Significado de nomes africanos


Uma curiosidade interessante.


Para quem está grávida e ainda não escolheu o nome...


Mara = Tempo
Marahaba = Obrigado
Marali = Essência
Mariama = Presente de Deus
Marjani = Coral
Marvena = Criança de dois planetas
Mmaabo = Sua mãe
Mbhali = Rosa
Meeca = Será de ouro, forte, valente
Mene = A que nunca está só
Mesi = Água
Milumbe = Novidades de bençãos
Minkah = Justiça
Moliehi = A que era aguardada
Mudiwa = Pessoa querida
Monifa = Eu tenho sorte
Montsho = Negra
Mumbi = Primeira das mulheres
Mutinda = Criança nascida depois de duas ou mais crianças do sexo oposto
Mwangaza = Ilumina
Myeisha = A que é muito amada
In Diário de Moçambique, Diálogo, 07 de junho/2008.

segunda-feira, 9 de junho de 2008

Fernão Capelo Gaivota - 1


Ao verdadeiro Fernão Capelo Gaivota
que vive em todos nós.

Primeira Parte

Era de manhã

e o novo Sol cintilava nas rugas de um mar calmo.

A dois quilômetros da costa, um barco de pesca acariciava a água. Subitamente, os gritos do Bando da Alimentação relampejaram no ar e despertaram um bando de mil gaivotas, que se lançou precipitadamente na luta pelos pedacinhos de comida. Amanhecia um novo dia de trabalho.

Mas lá ao fundo, sozinho, longe do barco e da costa, Fernão Capelo Gaivota treinava. A trinta metros da superfície azul brilhante, baixou os seus pés com membranas, levantou o bico e tentou a todo custo manter suas asas numa dolorosa curva. A curva fazia com que voasse devagar, e então sua velocidade diminuiu até que o vento não fosse mais que um ligeiro sopro, e o oceano como que tivesse parado, abaixo dele. Cerrou os olhos para se concentrar melhor, susteve a respiração e forçou... só... mais... um... centímetro... de... curva... Mas as penas levantaram-se em turbilhão, atrapalhou-se e caiu.

Como se sabe, as gaivotas nunca se atrapalham, nunca caem. Atrapalhar-se no ar é para elas desgraça e desonra.

Mas Fernão Capelo Gaivota — sem se envergonhar, abrindo outra vez as asas naquela trêmula e difícil curva, parando, parando... e atrapalhando-se outra vez! — não era um pássaro vulgar.

A maior parte das gaivotas não se preocupa em aprender mais do que os simples fatos do vôo — como ir da costa à comida e voltar. Para a maioria, o importante não é voar, mas comer. Para esta gaivota, contudo, o importante não era comer, mas voar. Antes de tudo o mais, Fernão Capelo Gaivota adorava voar.

Esta maneira de pensar não o popularizava entre os outros pássaros, como veio a descobrir. Até os próprios pais se sentiam desanimados ao vê-lo passar dias inteiros fazendo centenas de vôos rasantes, sozinho.

Ele não sabia por que, por exemplo, quando voava sobre a água a uma altitude menor que a metade do comprimento das suas asas aberta, podia manter-se no ar mais tempo, com menos esforço. Esses vôos rasantes não terminavam com a habitual amaragem de pés hirtos que feriam a água. Ele amarava de mansinho, os pés apertados contra o corpo, deixando apenas um rasto borbulhante. Quando começou a treinar as aterragens deslizantes na praia, e a contar em passos o comprimento do rasto na areia, os pais começaram a ficar deveras desanimados.

— Por quê, Fernão, POR QUÊ? — perguntava-lhe a mãe. — Por que é que lhe custa tanto ser como o resto do bando? Por que você não deixa os vôos baixos para os pelicanos, para o albatroz? Por que não come? Filho, você está que é só pena e osso!

— Não me importo de estar só pena e osso, mãe. Eu só quero saber o que posso fazer no ar e o que não posso, é tudo. Só quero saber isso.

— Escute, Fernão — disse-lhe o pai com bondade. — O inverno não está longe. Haverá poucos barcos e o peixe da superfície irá para zonas mais profundas. Se você tem necessidade de estudar, então estude o alimento e como consegui-lo. Esta história dos vôos está muito certa, mas você tem de pensar que não pode comer um vôo rasante. Não esqueça que a razão por que você voa é comer.

Fernão baixou a cabeça, obediente. Nos dias seguintes tentou comportar-se como as outras gaivotas; tentou de fato, gritando e lutando como o resto do bando, em volta dos pontões e dos barcos de pesca, mergulhando sobre restos de peixe e de pão. Mas não conseguiu.

"Não faz sentido", pensava ele largando deliberadamente uma anchova suculenta, que lhe custara bastante a ganhar, aos pés de uma velha gaivota esfomeada que o acossava. "Não faz sentido... Eu podia ganhar todo este tempo aprendendo a voar. Há tanto que aprender!"

Fernão Capelo Gaivota


Ontem reli um clássico da minha juventude: Fernão Capelo Gaivota, de Richard Bach.


Quem já não leu este livro? Aposto que poucos levantaram a mão.


Eu tinha lá pelos meus 12 anos e vivia em um colégio interno. Ao contrário do que alguns possam pensar, não era nenhuma prisão. Ao contrário, para mim, morar no Instituto Concórdia foi uma liberação e uma evolução tremenda.


O colégio possuía uma biblioteca fantástica, onde eu passava todas as horas livres. Costumava sentar no chão, entre as estantes. Escolhia um autor e lia-lhe todos os livros. Depois passava para outro, e assim por diante.


Mas o «Fernão» que li não era da biblioteca. Ganhei-o da minha mãe. Hoje entendo seus motivos escusos ao me dar aquele presente.


Para quem não leu - ou não lembra - o livro conta a história de uma gaivota, Fernão Capelo Gaivota, que foi expulso do bando por querer dar um significado especial a sua vida ou, em termos «gaivotícios», achava que a vida era mais do que voar simplesmente para pegar um bocado de comida.


Fernão buscava vôos altos, velozes, peripécias nunca antes tentadas ou imaginadas por nenhuma gaivota. E, claro, por querer voar mais alto (literalmente), foi incompreendido e banido.


Após viver muitos anos sozinho no exílio, anos em que aperfeiçoou suas técnicas de vôo, Fernão é levado para o que ele pensa ser o paraíso. Lá estão outras gaivotas que pensam como ele. Aprende a voar a velocidades tremendas, até chegar ao vôo à velocidade do pensamento. Torna-se instrutor das gaivotas que vão chegando, mas sente uma necessidade imensa de voltar ao seu bando, de ajudar os que ficaram a encontrar o esclarecimento.


Volta, então, para a Terra e forma um grupo de seguidores, também banidos do clã das gaivotas por quererem voar mais alto. Quando seus «discípulos» estão prontos, retornam ao bando. São recebidos primeiramente com desprezo, depois causam curiosidade e, por fim, muitas gaivotas ignoram as leis do bando - que bania os que se aproximassem dos banidos - e juntam-se ao grupo de Fernão.


Ele e seus discípulos começam a dar treinamento para as gaivotas que querem alçar vôos mais altos e, por fim, Fernão deixa Francisco Gaivota, seu primeiro discípulo, como sucessor e vai para um plano mais alto.


A mensagem do livro é clara: os que buscam iluminação ou esclarecimento, os que ousam querer mais da vida do que simplesmente passar os dias sem morrer de fome ou sede, são incompreendidos, vistos como estranhos, extravagantes, indesejados. Mas buscar o esclarecimento é um dever de todos, pois, segundo Fernão, todos nascemos com liberdade e a única lei que merece ser cumprida é a lei que respeita a liberdade.


Por outro lado, não se deve odiar ou ignorar os que nos banem por não nos compreender. Estes - e principalmente estes - precisam ser guiados, com amor, no caminho da liberdade.


Para quem já leu e sente saudades e para quem ainda não leu, vou postar aqui o livro. Espero que gostem e aproveitem. E, principalmente, que, com liberdade e amor, descubram que têm a liberdade de voar mais alto.

sábado, 7 de junho de 2008

«Os Intérpretes» de Wole Soyinka

Por P. Manuel Ferreira

O nigeriano Wole Soyinka formou-se muito na Inglaterra, onde exerceu parte do seu professorado. Dedicou-se sobretudo ao teatro. A sua peça «O Leão e a Jóia» teve grande êxito, tanto na Inglaterra quanto na Nigéria. Era revolucionária, enfrentava o problema da decadência dos valores da cultura tradicional, em decorrência da invasão dos valores ocidentais. Na festa da Independência da Nigéria, representou-se a sua «Dança dos Bosques». De 67 a 69 esteve preso por acusações de carácter político. Foi actor no primeiro filme nigeriano, baseado numa peça sua. Foi galardoado como Prémio Nobel de Literatura, em 1986.

Com que chave interpretativa interpretaremos «Os Intérpretes»?

Parece-me boa esta: como vimos, Soyinka é sobretudo um dramaturgo. Com razão o consideram o melhor dramaturgo africano de língua inglesa. Este romance divide-se em duas partes: a primeira com 10 capítulos e a segunda com 8. Transpondo para linguagem dramatúrgica, diremos que se trata de uma grandiosa peça dramática, em dois actos, um com 10 cenas, outro com 8.

Quem são «Os Intérpretes»?

São um grupo de 6 jovens nigerianos, formados geralmente no estrangeiro, culturalmente suspensos e mal instalados entre a cultura tradicional africana e as estrangeiras sobrevindas.

O Sekoni, filho de muçulmano e cristã, gago, engenheiro e escultor, genial, rejeitado por não alinhar com a alta corrupção. Inventor que, em vez de ser acolhido, metia medo e era repelido. Vítima da sua competência e honestidade. Opinava que a vida é a cúpula da continuidade. A cúpula da religião é que faz de ponte entre vivos e mortos (p. 16); a vida, o amor são caminhos para a cúpula universal (p. 34); uma mulher é a cúpula do amor e a cúpula da religião (p. 35); na cúpula do cosmos, há completa unidade da Vida. Vida é como a divindade, a pluralidade das suas manifestações é apenas uma ilusão… a vida, ou a morte, ambas estão contidas na cúpula única da existência. Tinha a ideia fixa, angustiada, de ter pedaços de carvão na boca (p. 34). Morreu atropelado por um camião.

O Sagoe, jornalista formado na América, filho de um milionário. Tinha muito talento, embora o desperdiçasse na boémia.

A Dehinwa, namorada de Sagoe, é a única mulher do grupo. Formada na Inglaterra graças às economias da sua mãe, por quem tinha um grande respeito, ao ponto de seguir intransigentemente a sua tradição da rigorosa virgindade até ao matrimónio, posição que Sagoe detestava, mas respeitava.

O Egbo, salvo das águas em menino, quando o pai, um respeitável reverendo (p. 24), evangelizador ambulante, e a mãe se afogaram quando a canoa foi ao fundo. Era incessantemente atraído pelo modelo dos mortos (p. 18). Perguntava: se os mortos não são suficientemente fortes para estarem sempre presentes na nossa existência, não poderiam ficar como estão, mortos? (p. 16). Achava que os mortos têm para com os vivos o dever de serem esquecidos rapidamente, proveitosamente (p. 135). Não devemos interferir com eles, porque então eles emergem, forçando os vivos a dilemas terríveis (p. 136). De rapazinho, rezava, deitado à beira da água com uma orelha colada ao solo, junto das águas em que os pais tinham morrido. Amigo do silêncio e da profundidade das águas, resolvia tudo numa simples alternativa de afogamento. O grupo considerava-o mulherengo. Até já em miúdo, um professor dizia que ele era maníaco sexual. Enquanto tinha a amante Simi, engravidou uma universitária, o que lhe trouxe o desgosto definitivo.

O Kola, professor de arte na Universidade. Tentava compreender tudo, que tentava clarificar as peças dentro das vestes acomodatícias do tempo, sentiu, mais tarde, num momento de tranquilidade e ordem, que o que faltava naquela noite era o poder de sacudir os acontecimentos, separando-os um a um e colocando-os em etapas sucessivas do período de criação (p. 269).

O Bandele, professor economista. Era uma imagem intemporal meditando sobre seres menores (p. 269). Velho e imutável, como as mães reais do trono de Benim, velho e cruel como o ogboni em conclave pronunciando a palavra (176).

E o Lasunwon, de quem se diz menos que dos outros. Era muito realista, seco, positivo.

Quem é que «Os Intérpretes» interpretam?

A si mesmos: suas vidas, recordações, ideais, contradições, traumas. E a sociedade, do ponto de vista sócio-cultural e político: Qual é o africano moderno que não vomita política? (p. 135). Sobretudo o problema da corrupção: chefes novos-ricos incompetentes, falsos, sujos, tudo show, mas sem conteúdo moral e intelectual e cultural. Luxo requintado a combinar com miséria nojenta. Corrupção em todos os níveis e aspectos. Sagoe foi descobrindo como os velhos e chefes eram indignos de respeito. Um mundo cão, onde cada um em que se defender sozinho (p. 109).

E qual dos seis será o protagonista?

A princípio, pareceu-me Sekoni. Mas, quando estava quase a identificá-lo e defini-lo, eis que, logo ao princípio do 2º acto, ele morre-me estupidamente debaixo de um camião desenfreado.

A seguir, pareceu-me ter reunidos os dados para nomear Sagoe. Mas ele desapareceu-me da cena, quase até ao fim.

Depois, apostei em Kola. Mas também ele não era.

E, finalmente, a maneira como fecha o pano parece convencer que é o Egbo. Tudo começa por ele e tudo por ele termina. No fim, todos ficam a saber que ele é que era o pai da criança da aluna de Bandele. Escândalo geral na universidade. Os comentários de professores e outra gente mais velha: O padrão da moral baixou realmente muito… (p. 274). O país inteiro está mergulhado numa apatia moral (p. 274). A geração actual é demasiado corrupta (p. 275).

Egbo sente-se rejeitado, amaldiçoado, perdido… os olhos eram faróis num oceano de singular tristeza… uma alternativa para um homem, que se afogava… sim, pensava Egbo, é apenas a alternativa para um afogamento (p. 276). Os pais tinham morrido afogados e ele salvara-se. Mas, finalmente, não escapou de se afogar, nesta outra espécie de águas profundas e lamacentas.

Mas, no fim das contas, cada um dos seis Intérpretes escapa à nossa nomeação para protagonista. Digamos que o protagonista, afinal, não é nenhum deles, em particular, mas todos eles, como um todo.

E à volta dos seis, como uma espécie de satélites necessários, giram outras personagens como: Simi, a misteriosa e intrigante amante de Egbo; Lázaro, o albino, que afirmava ter morrido e ressuscitado e fundou uma igreja rara e reunia à sua volta uns apóstolos, vindos da criminalidade; Noé, o pilha-galinhas a quem Lázaro pretendeu transformar num santo apóstolo e que morreu atirado na varanda do Joe Golder, vítima deste americano maricas; o professor Ayu, médico, complexado; e a sua esposa Mónica, uma branca desinibida.

«Os Intérpretes» lê-se com crescente interesse e entusiasmo. É como se estivéssemos a assistir a uma grande peça teatral de grande intensidade humana. Algumas cenas parecem passar-se aqui ao nosso lado. Na 8ª cena do 1º acto, uma multidão anónima furibunda corre atrás de um pilha-galinhas, com a clara intenção de o linchar. Na 2ª cena do 2º acto, assiste-se a um culto religioso todo charlatanice, ignorância e uma descarada demagogia. É perante esse espectáculo caricato que Bandele observa:
- Sagoe já tem o seu artigo. Kola encheu mais um espaço vazio na sua tela. E tu, Egbo, que vais tu extrair de tudo isto?
- O conhecimento da nova geração de intérpretes…

Quero morrer gaúcha - Olga Matos


Mas olha que coisa lindaça,
que venho encontrar aqui
as flores lindas dos pagos
os tragos doces dos vinhos
desta terra onde nasci!

Nessas horas sem alarde
sou senhora desses pagos
sou Anita Garibaldi,
ou prenda num doce amargo,
que sirvo e num riso trago.

Sou filha cá desta terra,
cativa dos seus encantos
nasci longe das serras,
verti cá dentre os pântanos,
vento e sangue litorâneo!

Já disse e torno a dizer
cá nos braços do minuano,
vivo e quero viver,
quero mortalha pampiana
no dia em que eu morrer!

O que é REIKI?


O REIKI está presente há muitos anos na minha vida. Pratico diariamente e recomendo sempre aos amigos.

Apesar da grande divulgação e do seu sucesso, muitos amigos ainda me perguntam o que é «esse tal de REIKI».

Resolvi, então, fazer uma série de postagens para tentar responder a todas as perguntas que me são feitas... digo tentar, porque ninguém consegue responder a tudo! Esta é a primeira.

Espero que gostem e comentem. Qualquer dúvida, perguntem - talvez eu consiga responder.

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O QUE É O REIKI?



REIKI é a palavra japonesa que significa energia vital universal. Atualmente, essa palavra está sendo utilizada para identificar o Sistema Usui de Cura Natural, uma antiga arte de curar pela imposição das mãos, redescoberta no Japão no século XIX pelo Dr. Mikao Usui (monge cristão de origem japonesa). A tradição REIKI, porém, já era mencionada em sânscrito pelos antigos Sutras da Índia há mais de 2.500 anos.

«REI» significa universal e refere-se à parte espiritual, à essência energética cósmica, que permeia todas as coisas e circunda todos os lugares.
«KI» significa uma parcela do REI que flui através de tudo aquilo que vive, é a nossa própria energia vital.

Essa energia vital recebeu nomes diferentes em cada cultura: chamada pelos cristãos Luz, pelos hindus Prana, pelos Kahunas Maná, pelos chineses Chi e pelos russos energia Bioplasmática; os índios iroqueses americanos denominam-na Orenda; em hebraico é chamada Ruach, Barraka nos países islâmicos e, finalmente, no Japão, Ki.

O REIKI é um processo de encontro dessas duas energias: universal com a nossa porção física, e ocorre após a pessoa ser submetida a um processo de sintonização ou iniciação do método feito por m mestre habilitado.

REIKI é um sistema completo para a autotransformação e evolução.

Ao assumirmos o REIKI como disciplina diária, qualificamos nosso campo energético, desbloqueando nossos traumas, expandindo assim a energia amorosa do nosso ser.

sexta-feira, 6 de junho de 2008

O Gaúcho


Quantos seres habitam as estepes americanas, sejam homem, animal ou planta,inspiram nelas uma alma pampa. Tem grandes virtudes essa alma. A coragem, a sobriedade, a rapidez, são indígenas da savana.

[...]

Como a árvore, são a ema, o touro, o corcel, todos os filhos bravios da savana. Nenhum ente, porém, inspira mais energicamente a alma pampa do que o homem, o «gaúcho». De cada ser que povoa o deserto, toma ele o melhor; tem a velocidade da ema ou da corça, os brios do corcel e a veemência do touro.

O coração, fê-lo a natureza franco e descortinado como a vasta coxilha; a paixão que o agita lembra os ímpetos do furacão, o mesmo bramido, a mesma pujança. A esse turbilhão do sentimento era indispensável uma amplitude de coração, imensa como a savana.

Tal é o pampa.

Esta palavra originária da língua quíchua significa simplesmente o plaino; mas sob a fria expressão do vocábulo está viva e palpitante a idéia. Pronunciai o nome, como o povo que o inventou. Não vedes no som cheio da voz, que reboa e se vai propagando expirar no vago, a imagem fiel da savana a dilatar-se por horizontes infindos? Não ouvis nessa majestosa onomatopéia repercutir a surdina profunda e merencória da vasta solidão?

Nas margens do Uruguai, onde a civilização já babujou a virgindade primitiva dessas regiões, perdeu o pampa seu belo nome americano. O gaúcho, habitante da savana, dá-lhe o nome de campanha.


José de Alencar

Melhor com Mercedes...

Gracias a la vida

Hoje o dia amanheceu ensolarado, com uma suave brisa que acaricia as folhas das árvores do meu jardim.

E meu filho acordou com o maior sorriso do mundo!

Então, só posso dizer...


Tarancon - Gracias a la Vida


Gracias a la vida que me ha dado tanto.
Me dio dos luceros que, cuando los abro,
Perfecto distingo lo negro del blanco,
Y en el alto cielo su fondo estrellado
Y en las multitudes el hombre que yo amo.

Gracias a la vida que me ha dado tanto.
Me ha dado el oído que, en todo su ancho,
Graba noche y día grillos y canarios;
Martillos, turbinas, ladridos, chubascos,
Y la voz tan tierna de mi bien amado.

Gracias a la vida que me ha dado tanto.
Me ha dado el sonido y el abecedario,
con él las palabras que pienso y declaro:
Madre, amigo, hermano, y luz alumbrando
La ruta del alma del que estoy amando.

Gracias a la vida que me ha dado tanto.
Me ha dado la marcha de mis pies cansados;
Con ellos anduve ciudades y charcos,
Playas y desiertos, montañas y llanos,
Y la casa tuya, tu calle y tu patio.

Gracias a la vida que me ha dado tanto.
Me dio el corazón que agita su marco
Cuando miro el fruto del cerebro humano;
Cuando miro el bueno tan lejos del malo,
Cuando miro el fondo de tus ojos claros.

Gracias a la vida que me ha dado tanto.
Me ha dado la risa y me ha dado el llanto.
Así yo distingo dicha de quebranto,
Los dos materiales que forman mi canto,
Y el canto de ustedes que es el mismo canto
Y el canto de todos, que es mi propio canto.

quinta-feira, 5 de junho de 2008

30 ou mais...


Sou balzaquiana, sim, «pero no mucho»!

Tenho 33 anos, sim, mas não me encaixo completamente no perfil da balzaquiana original, aquela descrita e desenhada por Balzac em «A Mulher de 30 Anos».

Infelizes no casamento - porque, na época em que o livro foi publicado, a única opção de vida da mulher era o casamento - aquelas balzaquianas eram violentamente despidas de suas ilusões na manhã seguinte à noite de núpcias. O príncipe encantado com que sonharam toda a sua vida transforma-se em «esqueleto odioso», nas palavras do pai de Júlia, a protagonista do livro.

Sou, então, uma balzaquiana moderna. Inconformada porque ainda me sinto com 15 anos, assustada porque já realizei os sonhos que tinha com aquela idade. Marido, filho, casa, cães.

E esta idéia de missão cumprida coloca-me em uma daquelas esquinas da vida. O que fazer agora? Que planos hei de seguir? Carreira, obviamente. Está na hora de pensar na carreira.

Mas não será tarde demais para isso? As outras balzaquianas modernas e não casadas já começaram há tempos, muito antes de adquirirem este status.

Confesso que é difícil decidir entre carreira e casa. Gosto de me dedicar integralmente às coisas e as duas não consigo conciliar.

E onde fica o «deixa a vida me levar»? Vamos indo e vamos vendo... por enquanto, continuo dividida, um pouco trabalho, um pouco cuido do marido e do filho.

E não é exatamente isso o que as balzaquianas modernas fazem?

Amicíssima, com saudades mando notícias de África

O tempo nunca é capaz de fazer esquecer o que não queremos. Assim foi conosco. Não te esqueci, amicíssima...
Aqui, neste país paradoxalmente lindo e triste, as coisas vão mal. De um lado da fronteira, manifestações de ditadura arcaica, opositores presos, torturas, povo sofrendo. Do outro lado, a terrível xenofobia, pessoas assassinadas, machucadas física e emocionalmente. E Moçambique está assim, apertado entre ódios e tentando manter-se ileso e pacífico... difícil quando o desemprego e a fome são agravados por milhares de refugiados do ódio vizinho...
E aí lembro daquela música «What a wonderful world» e penso que já não pode mais ser cantada com tanto entusiasmo. É... ultimamente ando preocupada com o mundo. Talvez coisa de mãe, que queira um futuro seguro para o rebento. É tanta desgraça espalhada por esta Terra que dá até arrepio! Onde não tem guerra, tem desastre natural. O que está acontecendo???
Outro dia conheci um paquistanês cristão (raridade!!! - são na maioria muçulmanos). Sabe o que ele disse??? «Os muçulmanos são os anti-cristos!». Quase bati nele! Intolerância assim, na minha cara? Nem respondi... virei as costas e jurei nunca mais ouvir estas besteiras.
No meio de tudo isto, meu clã está cada vez mais feliz. É verdade... se pensarmos na nossa vidinha e esquecermos o resto do mundo, tudo fica mais cor-de-rosa. E, falando nisso, quando é que a gente tem tempo para «cair a ficha» de que se é mãe? Olho para o pequeno e ainda não acredito... Estou chegando à conclusão de que aquela história de padecer no paraíso é mentira. Ainda não padeci, só estou no paraíso (desde que não saia de casa, não ligue a televisão, não procure notícias na Internet...).
Quem sabe esta seja a solução? Viver trancada dentro do clã. Babar o filho e mimar o marido... esquecer dos horrores lá de fora!
Mas este assunto já está repetitivo. Não esqueci dos nossos projetos, viu? Agora lembrei de outra música: «... temos todo tempo do mundo...». Será que temos?
Espero notícias, novidades, realizações e etecéteras.
E, como diria um metido a poeta, amplexos e ósculos!

quarta-feira, 4 de junho de 2008

Interseccionismo, Orpheu, Pessoa


Atravessa esta paisagem o meu sonho dum porto infinito

E a cor das flores é transparente de as velas

de grandes navios

Que largam do cais arrastando nas águas por sombra

Os vultos ao sol daquelas árvores antigas...


O porto que sonho é sombrio e pálido

E esta paisagem é cheia de sol deste lado...

Mas no meu espírito o sol deste dia é porto sombrio

E os navios que saem do porto são stas árvores ao sol...


Liberto em duplo, abandonei-me da paisagem abaixo...

O vulto do cais é a estrada nítida e calma

Que se levanta e se ergue como um muro,

E os navios passam por dentro dos troncos das árvores

Com uma horizontalidade vertical,

E deixam cair amarras na água pelas folhas uma a uma dentro...


[...]


(Chuva Oblíqua, Fernando Pessoa)

terça-feira, 3 de junho de 2008