sexta-feira, 6 de junho de 2008

O Gaúcho


Quantos seres habitam as estepes americanas, sejam homem, animal ou planta,inspiram nelas uma alma pampa. Tem grandes virtudes essa alma. A coragem, a sobriedade, a rapidez, são indígenas da savana.

[...]

Como a árvore, são a ema, o touro, o corcel, todos os filhos bravios da savana. Nenhum ente, porém, inspira mais energicamente a alma pampa do que o homem, o «gaúcho». De cada ser que povoa o deserto, toma ele o melhor; tem a velocidade da ema ou da corça, os brios do corcel e a veemência do touro.

O coração, fê-lo a natureza franco e descortinado como a vasta coxilha; a paixão que o agita lembra os ímpetos do furacão, o mesmo bramido, a mesma pujança. A esse turbilhão do sentimento era indispensável uma amplitude de coração, imensa como a savana.

Tal é o pampa.

Esta palavra originária da língua quíchua significa simplesmente o plaino; mas sob a fria expressão do vocábulo está viva e palpitante a idéia. Pronunciai o nome, como o povo que o inventou. Não vedes no som cheio da voz, que reboa e se vai propagando expirar no vago, a imagem fiel da savana a dilatar-se por horizontes infindos? Não ouvis nessa majestosa onomatopéia repercutir a surdina profunda e merencória da vasta solidão?

Nas margens do Uruguai, onde a civilização já babujou a virgindade primitiva dessas regiões, perdeu o pampa seu belo nome americano. O gaúcho, habitante da savana, dá-lhe o nome de campanha.


José de Alencar

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